Influenciador condenado por manter empregada em trabalho análogo à escravidão diz que 'rejeita qualquer forma de exploração'
14/12/2025
(Foto: Reprodução) Peter Liu é condenado por manter empregada em trabalho análogo à escravidão por 30 anos
O influenciador Peter Liu, condenado pela Justiça por manter uma empregada em trabalho análogo à escravidão por 30 anos, usou uma de suas redes sociais para se manifestar sobre o assunto neste domingo (14). Na postagem, disse que as acusações não correspondem à realidade e disse reafirmar "seu compromisso com a dignidade humana e rejeição a qualquer forma de exploração" - veja na íntegra abaixo.
Com pelo menos 4 milhões de seguidores nas redes sociais, Peter Liu, a mulher e os filhos foram condenados pela 10ª Vara do Trabalho de Campinas a pagarem R$ 1,2 milhão em obrigações trabalhistas a mulher, sendo fixado R$ 400 mil a título de danos morais. Cabe recurso.
Segundo detalhes do processo, a vítima atuou como babá, empregada doméstica e funcionária da clínica de Peter Liu. Nesse período, segundo o advogado que a representa, além da falta de garantias trabalhistas e direito à aposentadora, nunca teve acesso à educação.
"Jogaram ela para o desamparo. Ela foi babá dos dois filhos. Eles cresceram, se desenvolveram, se tornaram médicos e ela continuou semianalfabeta", ressalta Bruno Silvestre.
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A decisão foi proferida em 13 de agosto de 2025, mas o g1 teve acesso aos autos neste sábado (13). O advogado que representa Liu e seus familiares foi procurado, e a reportagem será atualizada assim que ele se manifestar.
Manifestação
Em uma postagem feita com os comentários fechados, Peter Liu disse que em respeito às pessoas que o acompanham, se manifestou sobre o caso, mas, por orientação jurídica, sem dar detalhes do processo em andamento na Justiça do Trrabalho.
Antes de a condenação de Peter Liui vir à tona, ele possuía 950 mil seguidores nessa rede social. Um dia depois, já havia perdido ao menos 6 mil.
Veja a manifestação na íntegra:
"Em respeito a todos que me acompanham, quero me manifestar com serenidade sobre as informações que vêm circulando nos últimos dias.
Existe um processo judicial em andamento envolvendo meu nome. As provas apresentadas demonstram que as acusações não correspondem à realidade, mas por orientação jurídica e respeito ao devido processo legal, não posso comentar detalhes neste momento.
Trata-se de um tema sério e sensível. Reafirmo meu compromisso com a dignidade humana e minha rejeição a qualquer forma de exploração.
No momento adequado, prestarei os esclarecimentos necessários. Agradeço a compreensão".
Peter Liu, influenciador de medicina chinesa condenado pela Justiça trabalhista de Campinas (SP) por manter uma empregada em trabalho análogo à escravidão por 30 anos, se manifestou sobre o caso pelas redes sociais neste domingo (14)
Reprodução
'Sem entender'
O advogado Bruno Silvestre destaca que a mulher, após anos de dedicação exaustiva, não consegue mais trabalhar como antigamente, e ainda tenta entender os reflexos da situação vivida com a família de Peter Liu.
"Imagina uma pessoa que ficou numa casa vivendo para uma família ter que entender que ela foi explorada por 30 anos. Entender que aquelas pessoas que ela admirava, que tinha um vínculo, que ela tentava ajudar e tudo mais, eram pessoas que não queriam o bem dela", disse.
Silvestre explica que para viabilizar uma reparação para a vítima, eles chegaram a buscar um acordo com a família de Peter Liu na Justiça Trabalhista, sem sucesso.
O g1 apurou no processo que foram realizadas pelo menos três audiências de conciliação, sem que houvesse um desfecho positivo para a vítima, sempre em desacordo sobre os valores envolvidos.
Na audiência mais recente antes do julgamento em primeira instância, em novembro de 2024, Liu, a mulher e o filho mais velho chegaram a oferecer R$ 280 mil em 24 parcelas, e "o reconhecimento do vínculo por mera liberalidade até 2015".
A empregada e seu representante formalizaram que aceitariam R$ 750 mil parcelados em 24 vezes, com o reconhecimento do vínculo empregatício, mas não houve acordo.
Na sentença proferida em agosto, a Justiça reconheceu o vínculo de emprego como empregada doméstica pelo período de 1º de abril de 1992 a 31 de agosto de 2022, determinando o pagamento de salários, horas extras, férias remuneradas, 13º salários, além de multas e indenizações pelo período.
O juiz determinou ainda que, após trânsito em julgado, sejam expedidos ofícios ao Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia Federal para apuração do crime de redução à condição análoga à de escravo, previsto no art. 149 do Código Penal, que prevê pena de reclusão de 2 a 8 anos.
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O influenciador de medicina chinesa, Peter Liu, foi condenado pela Justiça do Trabalho por manter uma emprega em trabalho análogo à escravidão por 30 anos em Campinas (SP)
Reprodução/redes sociais
Trabalho análogo à escravidão desde 1992
Segundo a ação, a mulher foi induzida a sair de seu estado natal, Pernambuco, com a promessa de que tão logo o casal de origem chinesa se regularizasse no Brasil, ela passaria a receber salários, o que não aconteceu.
A vítima conta que desde 1992 está em Campinas, onde ficava à disposição de Peter Liu e a família por 24 horas, sem nunca ter recebido salário, férias ou descanso semanal, sendo mantida em ambiente impróprio.
A rotina exaustiva, segundo depoimentos, começava às 4h da madrugada, quando preparava o café da família Liu, e depois seguia para a clínica, onde permanecia, por vezes, até às 22h30.
Inicialmente, a mulher contou que dormia em um sofá, e depois em uma maca em condições degradantes dentro de uma clínica irregular que o influenciador mantinha. A alimentação, muitas vezes, era fruto de doação por algum paciente da clínica.
Ainda de acordo com a ação, a mulher rompeu o vínculo com a família em 2022, após receber ameaças da mulher de Liu, e buscou auxílio jurídico.
Atualmente, convive na casa da filha de Peter Liu, de quem cuidou desde a infância, e com quem criou laços - a filha, inclusive, disse em depoimento que assim que tomou ciência da situação, interrompeu qualquer forma de prestação de serviços e a incentivou que a mulher procurasse a Justiça.
O que dizem as partes?
Peter Liu, a mulher e o filho apresentaram contestação conjunta no processo, e negaram a ocorrência de trabalho análogo à escravidão, defendendo a tese de que "a relação com a empregada sempre foi de natureza familiar e de assistência gratuita, tendo sido a autora acolhida ‘como se fosse alguém da família’".
Os réus negaram ainda qualquer restrição de liberdade, e afirmaram que a habitação sempre se deu em condições dignas, e que a ação seria uma manobra da mulher junto com a filha para obter vantagens financeiras indevidas.
Peter Liu e os demais réus, no entanto, não negaram que jamais houve pagamento de salários. Na contestação, argumentaram que “sempre que a autora precisava de algum valor, os réus forneciam o correspondente ou mesmo poderia ela separar da receita diária”.
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